segunda-feira, 25 de novembro de 2013

desfazendo as malas



Você me manda ir embora.
Me manda abandonar tudo o que é só nosso, rasgar nossos silêncios, quebrar nossos sorrisos com um soco de esquerda, entornar cada letra do "e u t e a m o", e desfazer toda a rima desse compasso. Me manda desatar o "nós", enlouquecer dessa saudade, te estender no varal e me amarrotar no teu abraço. Você manda eu dobrar esse amor e enfia-lo no bolso.                                 Agora, não me peça para virar a ampulheta, porque eu só faço o que você manda. 

quarta-feira, 25 de setembro de 2013

Oração



      É quase manhã e cá estou, do outro lado de mim, abrigada em tudo o que calo. Ser acordada no meio da noite pra lembrar do que passou o dia tentando fugir. Eu tenho fugido muito, sempre pro mesmo lugar. Tenho dois nós na garganta que hoje vieram a apertar. 
      Deus, regente do universo, ando com saudade da tua mão, talvez você só esteja respeitando o meu querer, mas eu não quero mais, eu quero paz. Eu quero me estender, do tamanho que a minha alma precise saltar para caber, ser tão ampla quanto qualquer incerteza dessas que carrego. Quero ouvir mais, dizer menos. Quero um vazio pleno. 
      Tornei a pecar! Querer, querer, querer... Se tem coisa que nunca deixamos de fazer na vida, desde o seu primeiro momento é querer. E já que não se pode fugir pra outro lugar, baby, continuo querendo colo, continuo exilada em mim. Luz, graditão e amor! O resto é o que canto. 

quinta-feira, 12 de setembro de 2013

fulanos, ciclanos e beltranos

   
      Outro dia um amigo passou a mão em um dos meus cadernos para ler e disparou: Por que nenhum dos poemas tem título? Na hora eu desconversei e dei a desculpa que qualquer escritor contemporâneo daria: Dar nome empobrece! Pensando sobre, lembrei que sempre perdi pontos em redação na época da escola por causa disso, nunca dava títulos aos textos.
      É no mínimo estranho você não saber nomear uma coisa que saiu de você, fico pensando no dia em que eu tiver um filho, ele provavelmente terá um nome dado pelo pai ou ficará sem até poder escolher como quer se chamar. Exageros à parte, é assim que me sinto quando sou quase obrigada a intitular qualquer coisa.
       Dar nome à poesia é tratá-la como mercadoria, digamos que "é assim que se vende o peixe" e definitivamente o meu alívio não cabe na embalagem de um sabão em pó. Um poema é sempre alguém, e quando não tem título é todo mundo. Ou ninguém. Talvez seja esse o meu problema, o limite. Ser fulana de tal no cartório me arranca a possibilidade de ser ciclana e beltrana. Eu só significo aquilo? Os versos que rasguei só significam você?
   

terça-feira, 10 de setembro de 2013

Quase

   
      Hoje não tem você. Tem janela aberta e sol na varanda, tem coisa nova na caixa de correio, tem gente me ligando por engano, tem gelatina de limão na geladeira e minha avó cantando uma ciranda. Tem Caetano no vizinho, Leminski na cabeceira e rosa nova no meu canteiro. Seria mais um dia comum se não fosse o nascimento da flor.
      Na minha vida, setembro só chega quando alguma coisa começa a florir e isso não tem nada a ver com "dar certo", tem a ver com acontecer, brotar, germinar. Tem a ver com sorrir para desconhecidos, podendo ser um último gesto de afeto. Com ir ao cinema sozinho e enfrentar a solidão de tanta gente acompanhada. Tem a ver com a beleza de toda história mal contada.
      Para não dizer que eu só falei das flores, falei também das coisas que inquietam o coração, este que deixou de ser só um órgão para acumular funções. Por que não deixá-lo bater à vontade? Bater com vontade, te arrebentar a cara. Às vezes dói, mas logo passa, como o mês de agosto. E isso não tem nada a ver com você, é coisa minha, coisa que você não é.
      Hoje tenho paz no meu quintal e quiçá um tanto de fé. Tenho um filme francês, tenho bolo com café. Tenho rimas prontas, tenho tinta e papel... Mas ainda falta alguma coisa.
   
   
     
   

domingo, 8 de setembro de 2013

6 cervejas X essa coisa prata no céu

   
      Era domingo, início de tarde, era hoje. Tirei o pijama, ajeitei os cabelos e troquei alguns passos até o mercado. Voltei com meia dúzia de garrafas de cerveja e me embriaguei de você. Ao som do rock do Erasmo, cada gole me dava a liberdade condicional, mas você é minha santa dose, carcereiro, meu crime passional. Que caso, que caos! Enquanto te procuro, sigo em reclusão juntando tudo que está embaralhadamente solto na minha cabeça. 70% você, 30% você comigo. Aliás, pelo menos isso temos em comum, nós dois só pensamos em você.
      "Você é o meu enredo, vem pra cá..." Essa é a parte que eu já estou na quarta cerveja, solo fértil pra chorar. Não chorei, achei desaforo. Resolvi calar. É, quando o nó for na garganta, cala que desce aos dedos. É melhor sujar a alma com tinta de caneta do que lavar com essa coisa salgada que cai dos olhos.
      A tarde acaba, a cerveja também e cá estamos, eu aí, você aqui, sob a mesma lua que hoje violentamente nos rouba de nós. Fora da lei, desconcerta a poesia desse amor atroz. Eu queria escrever alguma coisa que me lembrasse de te esquecer, mas com esse céu fica difícil falar sobre a sobra de espaço nos abraços, a falta de tempo nos mesmos. Sobre a saudade que tenho do peso dos teus olhos em mim ou sobre qualquer coisa que não seja essa coisa prata arrebatadora nesse vasto azul marinho.

sexta-feira, 6 de setembro de 2013

ensaio sobre o amor

                                               

      Certa vez me disseram que não se ama de uma hora para a outra. Não desacreditei, mas e tudo aquilo que aprendi ao longo da vida assistindo comédias românticas? Aqueles esbarrões nas calçadas que terminavam em casamento em menos de duas horas, o garoto mais lindo da escola que senta ao lado da garota mais esquisita e a transforma em uma princesa até o baile de formatura, o brilho nos olhos enquanto ainda desconhecidos cantam em um karaokê numa festa de fim de ano... Conversa pra boi dormir! Ninguém ama um desconhecido. Ou ama demais até conhecê-lo de fato. O amor é uma construção onde equilibradamente colocamos nossos tijolos, um a um, destruindo paredes.
      Não é fácil, é muito mais sério do que caminhar de mãos dadas ou pegar um cineminha numa tarde de domingo. Amar é um ato de coragem e ter coragem é agir com o coração, é peito aberto para receber o outro, sem filtros. É dividir para ser um. É desaprender. Trocar. Ressignificar. Você ama o outro, ou se ama no outro? Ninguém morre de amor, muito pelo contrário, morre por não conhecer o amor. Ou por confundi-lo com uma paixão meia boca qualquer. Todo amor que é dado, volta. E isso é lei, tarda mas não falha.
     Amar é bordar à mão a solidão de dois sem costurar os corpos, é manter firmeza na linha tênue. É um abraço menos apertado e mais abrigo. É lacuna... Se eu pudesse escolher, ficaria com o cinema americano.